Veothar não sabe o que pensar. Em meio a seu sonho, em meio ao templo de Ethar que guarda em sua alma, ele conversa com um meta-humano estranho a seus olhos, que dá a ele uma missão improvável: comandar um expurgo em Insag.
- Não faz sentido... Tirá-los de Insag? Insag é a casa deles, é um lugar abençoado, um refúgio do mundo, um sonho de Andir e de toda a raça kampfa. A alma e orgulho dessa gente estão plantados aqui.
Dentro de seu sonho, dentro do templo, que é o equilíbrio na profundeza de sua alma, Veothar busca compreender o que aquele meta-humano, de vibrações amistosas, queria realmente. Continuava postado à sua frente, com a aparência albina, com suas vestes brancas... Veothar o fitava com mais curiosidade, com mais atenção, buscando conexões em sua mente que o ajudasse a raciocinar o que aquele invasor de sonhos dizia.

- Eu sei, Veothar, não é algo fácil. Mas entenda. É a forma que há de preservar estas vidas. Quando o comando deflagrar a missão meta-humana em Insag, os Escorpiões identificarão nossa presença. A reação será imprevisível.
- Quem é você?
- Sou alguém do outro lado. Do lado que não concorda com as atitudes de meu comandante Titan.
- Mas ele é seu comandante.
- Você era um militar. Você deve saber. Recebemos comandos dos quais não concordamos. Tomamos conhecimento de injustiças, de atrocidade, de desvios de conduta. Tentamos, dentro de nossa subordinação, questionar. Mas ao não nos dar ouvidos, o máximo que podemos fazer é nos esconder atrás do silêncio que a posição de comandado nos dá. Podemos nos calar para eles, nos curvar à ordem superior. Mas também podemos não nos calar nem nos curvar para nós mesmos. E buscamos formas de salvar o que acreditamos.
Veothar o escuta atentamente. Teve contato com outros meta-humanos. Três, a bem dizer, que viviam junto com Dra Eliar. Um deles acompanhou Veothar em sua viagem até Insag, mas ficou na tribo Amagor, idolatrado pelos habitantes. Mas também porque viu que lá eles guardavam preciosidades meta-humanas, catadas nas batalhas. O que poderiam lhe ser úteis. Estes meta-humanos que conheceu são clandestinos, dados como mortos, que se passam por humanos há muitos anos. Então aquela era a primeira vez que Veothar conversava com um deles em pleno cumprimento de suas atividades.
Veothar identifica coerência no que o meta-humano fala. Ele mesmo já havia passado por comandos que traiam a si mesmo, e nunca se perdoou por os ter cumprido.
- Há mais uma coisa que preciso que reflita, Veothar. Sartânios fizeram contato mental com você, intensos, profundos. Há uma chance de uma via inversa. Através do Onicon, você pode tentar ir a eles. Vê o que eles veem. Eles tentarão bloquear sua invasão. Mas você tem força e pode vencer este bloqueio. Precisamos saber o que há lá embaixo.
- Eu não gosto deste Onicon. Não gosto de invadir sonhos.
- Mas precisa! Alguém muito especial esteve em Insag.
- Marieh?
- A menina... Há algo nela que é especial. Mas não me refiro à ela. No passado, havia alguém de padrão diferente de energia.
- Quem?
- Não sabemos identificar. Mapeamos há alguns anos. Não desencarnou, mas desapareceu de nossos sensores. Temos suspeitas de que eles mantem humanos lá embaixo.
- Por Ethar! E você acha que este humano está lá?
- Há possibilidade que esteja. Mas não sabemos se é humano...
Veothar permanece pensativo. Há muito o que conhecer em Insag. A missão que lhe foi dada, de salvar a neta de Andir, era parte de uma realidade emaranhada que ele precisava desvendar. Insag era um ponto de convergência, ou de conflito, entre remanescentes da Aliança Escorpião, meta-humanos, Cinturão de Orion, humanos... e havia algo mágico e nebuloso naquele lugar.
A imagem do meta-humano ganha novamente o brilho ofuscante que embranquece aos poucos todo o templo da alma de Veothar, até cegá-lo de tanta luz. Sente-se então repentinamente cair num vazio, até recuperar-se num forte insuflar de fôlego e solavanco do corpo sobre a cama da casa de saúde. Olha assustado a sua volta, vê um assistente voltar-se para ele surpreso. Percebe que está com o braço perfurado por acesso de soro e sendo monitorado por aparelhos.
- Olá! Calma, está tudo bem! – o assistente tenta o confortar.
- Onde estou?
- Não se preocupe, o senhor está bem, estava desidratado e cansado, apenas isso. Você está na casa de saúde de Insag.
- Quantos dias? Quantos dias estou aqui.
- Há 16 horas. Precisa descansar ainda.
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