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4. TRÊS SAMAÚMAS

Foto do escritor: E. J. Eluan JrE. J. Eluan Jr

Atualizado: 24 de out. de 2022


Na manhã seguinte, a tutoria de Nelis já havia começado cedo quando Marieh chegou atrasada e apressada. No grupo, além da tutora, que substituía a enferma Agnar, havia mais 3 meninas e 2 meninos da tribo com idades entre 13 e 16 anos. Um tanto ofegante, Marieh dos Nasir se desculpa.


- Perdão, Nelis, me atrasei...


- Sem problemas. Te entendemos. Achávamos que nem vinhas... Estamos todos preocupados com Agnar... soube que você foi visitá-la, que bom!


Marieh esboça um sorriso de agradecimento e cumprimenta a tutora baixando levemente a cabeça. Depois, busca um lugar entre as raízes da grande samaúma para se acomodar. Algumas dessas raízes tem mais que o dobro da altura de um homem adulto. Marieh escala e se senta em uma dessas. É uma das três gigantescas árvores que ficam nas proximidades de Insag. As três samaúmas se destacam na silhueta da floresta quando olhada de longe por algum viajante que chega do deserto avizinhado. O estudo proposto pela tutoria é exatamente sobre as inscrições rupestres traçadas no milenar tronco.


- ... então, continuando, tudo indica que estas inscrições nunca tinham sido vistas até a chegada dos fundadores de Insag – fala Nelis. – Agnar, quando mais jovem, chegou a levar fotos das inscrições para estudiosos das universidades em Nemansky, quando ainda existiam. E ninguém identificou registros sobre elas. O Boatong, aqui de Insag, que foi um grande estudioso de botânica no passado, também disse que nunca tinha ouvido falar...


- Mas Nelis, – pergunta Isma, uma das alunas – se estas inscrições nunca tinham sido vistas, fico pensando... Esta parte da floresta, mesmo próxima a Nemansky, será que ninguém veio aqui antes dos fundadores e fizeram estes riscos?


- Claro que não! As inscrições são antigas, de mais de mil anos. Foram feitas pelos kampfas antigos. – interfere Marieh, um tanto seca.


- Sim, mas cadê vestígio de civilização antiga por aqui? - retrucou Isma.


- Estamos a menos de um quilômetro da tribo. Alguém encontrou por aqui alguma coisa de civilizações antigas? – Cato, outro aluno, reforça a dúvida de Isma.


- Não por enquanto. Não que a gente saiba. Josah e os fundadores chegaram por aqui há 29 anos, mas nunca ninguém atentou para nada do tipo, a não ser estas inscrições aqui – responde Nelis.


- Lembram das aulas de cultura antiga Klir? - pergunta Isma. - Eles têm cidades inteiras da antiguidade encontradas e preservadas. Pirâmides, artefatos, estátuas, monumentos, armas...


- É diferente, Isma. – responde Nelis, sentindo que o debate que provocara chegara no ponto onde queria. – muitas civilizações antigas dos klir, muitos e muitos anos atrás, bem antes de eles colonizarem áreas como a nossa, já eram assentadas em áreas de montanhas ou planaltos com um relevo bem diferente do nosso. A cultura deles se desenvolveu na base do trabalho em material durável abundante ali, como pedra, mármore... Suas obras e objetos são muito mais duráveis ao tempo.


- Mas então... deveríamos ter encontrado algo assim aqui também se tivesse uma civilização tão antiga.


- Mas encontramos agora. Olha só. – fala Marieh apontando para as inscrições na samaúma.


- Não, isso não é pirâmide, não é templo de mármore, não é estátua, não é cidade perdida...


- Isma, nós não somos klir. Você não pode querer encontrar aqui uma pirâmide dos klir. – responde Marieh com certa indignação à amiga.


- Eu sei, Marieh! Mas deveria ter umas construções aqui, sei lá, ruínas, objetos...


- As antigas nações kampfa não lidavam com pedras, mármores, ferro... não tinham nada muito durável em abundância. Tudo faziam com barro, folhas, madeira, argila, tecido, palha e papel. Tudo muito perecível. Nosso terreno é de planície, não há muita pedra. E muita área de várzea, que sofre com abundância de chuva e cheias e vazantes de rio. A história kampfa se perdeu facilmente, a não ser por cerâmicas encontradas em outros pontos de antigos territórios kampfas. Ou em samaúmas milenares como esta. Só que muitas foram derrubadas... Esta guarda um forte indício de que havia sim uma civilização muito antiga aqui. Quem sabe, se escavarmos com atenção nos arredores, encontramos artefatos, cerâmicas, ossos... ?


- Então as nações kampfas podem ser tão antigas quanto as klir! Só não faziam suas coisas em material tão durável... - Isma se surpreende ao entender.


- Olhem estas inscrições. – aponta Nelis para os desenhos na samaúma. - Elas são muito antigas! Se comparados à iconografia de vasos que conhecemos, da cultura kampfa, há distorções. Isso foi observado pelo Boatong, que entende bem de árvores. É como se estas inscrições , rasgadas e pintadas no duro troco, que tem mais de 10 mil anos, tivessem sido distorcidas pelo crescimento da própria árvore.


- 10 mil anos!? Essa samaúma tem mais de 10 mil anos!? – perguntou, incrédulo, Rassandra, outra das alunas.


- Sim. E dos poucos artefatos e cerâmicas que sobreviveram ao tempo, alguns tem mais de 15 mil anos! - completa Nelis.


Enquanto a aula acontece, Marieh se atenta para alguns dos desenhos que tem dimensões maiores. Parece uma figura humana, com uma lança. Mas próximo, uns seres que muitos interpretam como não sendo desse mundo. Tem pernas arqueadas em duas dobras, longos braços e longos dedos. Alguns em Insag já os interpretam como batráquios, já que eram animais adorados por algumas nações kampfa. Haviam outros desenhos estranhos, com corpo longo demais e cabeças pequenas, e que também podiam ser interpretados tanto como humanos normais deste planeta como de fora.


- Entenderam? Os kampfa, que sempre estiveram fora dos livros dos klir e dos nossos próprios livros, que são também livros influenciado pela forma estrangeira de ver o mundo, podem ser mais antigos que os próprios klir... - completa Nelis.


- E se esses desenhos foram feitos por outros seres... de fora? Digo, de fora do nosso mundo? - pergunta Marieh, intrigada. E causa silêncio nos demais. - Algumas figuras que estão aí.... Minha tia Aleh diz que são sartânios, os mesmos das histórias que ela conta. Outros ela diz que também não são gente daqui desse planeta. Meu avô contava sobre eles, assim como minhas tias contam pra gente, da época da guerra. Meu avô matou o líder de Lisar porque esse cara estava dominado pelas raças de Orion e meu avô dominado pelos sartânios. E Monsenir chegou a lutar contra esses sartânios. E disse que meu pai alertava que era sempre para tomarmos cuidado quando cavar a terra... eles podiam aparecer, porque vivem nas profundezas do planeta. A gente nunca sabe direito o que é lenda, o que é verdade...


- É prematuro ligar estes desenhos às histórias contadas pelas suas tias, Marieh - pondera Nelis. Segundo elas e Monsenir, a guerra entre Orion e sartânios aconteceu há 40 anos em Sideron. Os desenhos datam de cerca de 10 mil anos...


Todos ficam, então, pensativos e olhando para os desenhos. Passam a interpretar os desenhos com os olhos contaminados por estas lendas contadas pelos mais antigos de Insag, especialmente por Aleh e Mishna, irmãs de Josah, tias de Marieh. Monsenir, o único vivo em Insag que vivenciou diretamente a guerra, pouco fala sobre suas experiências.


O silêncio é interrompido pelo barulho de passadas rápidas que se aproximam. É Pasir assistente direto de Monsenir. Ele chega ofegante. Chega perto de Nelis e, com semblante tenso, fala algo ao ouvido dela.


Nelis subitamente olha para Marieh com expressão de preocupação.


- Querida... temos que ir na Casa de Saúde... Agnar... não está bem.


 

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